sábado, 28 de novembro de 2015


Resgatando a época dos alto-falantes
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 27 de janeiro de 1988
A feliz ideia de implantar rádios populares na periferia de Curitiba, num trabalho de integração comunitária, é uma espécie de sofisticação dos antigos serviços de alto-falantes, que durante décadas se constituíam em válida forma de comunicação nos bairros e cidades do Interior. Especialmente nos fins de semana, em festas paroquiais, junto aos circos e parques de diversões - que praticamente desapareceram a partir dos anos 70 - os serviços de alto-falante, com sua linguagem própria, rodando antigos sucessos em frágeis 78 rpm (quando ainda não existia o elepê), levavam a alegria e a comunicação a muitas comunidades. xxx Até hoje, nunca houve preocupação de se estudar a função social-cultural que os serviços de alto-falante representam em todo o Brasil (e que ainda subsistem em algumas comunidades menores). Muitos profissionais do rádio começaram dentro de serviços de alto-falante, como locutores e técnicos. Bonitas vozes se revelaram e a improvisação que os "animadores" faziam especialmente nas "dedicatórias" das músicas - "o rapaz de terno de linho branco oferece a guarânia "Índia" para a moça de blusa vermelha e saia azul que está na roda gigante" - marcava uma época. xxx Em Curitiba chegaram a existir mais de dez serviços de alto-falante, alguns dos quais representaram, por anos, a sobrevivência profissional de algumas famílias. Hoje, praticamente inexistem em termos autônomos - e através da rádio popular, a Fundação Cultural estará oferecendo aos bairros um veículo que fala de assuntos locais, transmitindo inclusive partidas de futebol (o fim do chamado "futebol de várzea" é outro aspecto a ser estudado na transformação urbana), substituindo, felizmente, a linguagem pasteurizada, cansativa e imposta com o pior da música - tanto nacional como internacional - que as AMs e, especialmente, as FMs, trouxeram nestes últimos anos. Uma reação popular, humilde - mas profundamente honesta e coerente, com gosto de povo, à falsa elite e a linguagem pernóstica, falsamente acariocada, que os jovens "comunicadores" das rádios particulares insistem em impor junto aos ouvintes.


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