quinta-feira, 25 de junho de 2015

O Preço da Felicidade


         Na Penumbra da tarde que já finda, olho pela janela do meu quarto e vejo o pau-d'arco florido, com sua enorme copa lilás contrastando com o verde das matas da Ibiapaba. Os raios de sol que se despedem pincelam o céu de um amarelo ouro, num rasgo de luz que atinge a alma de quem sorve a poesia daquele momento de êxtase. Há um silêncio misterioso envolvendo aquele sítio tão longe da civilização. Ao meu lado vejo o LU, companheiro de quarenta anos de vida, que dorme tranquilo na rede branca, armada no alpendre da casa grande. O gado já volta ao curral, numa procissão determinada, fazendo parte do cenário da natureza exuberante e bela. Numa metamorfose os anos retrocederam e eu vejo o LU, ainda rapazinho, lindo, magrinho, com uma camisa xadrez, passeando pelo “jardim de Iracema”, onde assistíamos a apresentação da banda de música, no coreto erguido no meio da praça. Eu o vi todo romântico cantando nas saudosas serenatas e pensei na suave carícia do primeiro beijo. Relembrei a doce ventura da hora do nosso casamento… E numa caminhada veloz através do tempo, os acontecimentos foram compondo uma realidade tão diferente de tudo aquilo que tínhamos imaginado: o impacto do desconhecido; as nossas diferenças; as dificuldades financeiras; a difícil adaptação à nova vida; a demora da chegada dos filhos; o vazio que se estabeleceu; suas ausências noturnas; a solidão e o silêncio, enfim a fuga de nós mesmos. Vieram à tona a difícil luta de uma professora primária, que abandonara o Curso de Pedagogia e as promessas de vida de um crescimento pessoal e social, por uma reclusão num sítio até então completamente desconhecido para ela. Tantas alegrias, tantas esperanças, tantas promessas de amor, porém quantas decepções e quantas incertezas… Vida – caminho íngreme onde deslumbramos apenas a felicidade e nunca estamos preparados para o imprevisto. O difícil da vida é você aceitar os seus problemas e ter forças para enfrentar os desafios. Tudo depende de Deus e de nós mesmos. É preciso acreditar no bem, na justiça e na verdade. É preciso lutar quando pensamos que já não existe mais esperanças. Somente o amor poderá nos transmitir esta energia de querer vencer. Olho para LU que já desperta sonolento. Levanta-se rápido e eu o vejo tão bonito ainda, alto, esbelto, de rosto bem delineado, emoldurado pelos seus cabelos já grisalhos. Sinto-o por trás de mim envolvendo-me num abraço que se repete todos os dias; é como um agradecimento pela opção que fiz alguns anos atrás. Lá na cidade ficaram: o meu clube, o meu mundo, a Faculdade, a convivência social, o meu trabalho, a minha filha e a minha neta. Aqui apenas a natureza esplendorosa, o amor e uma cabana. Lá ficaram todas as minhas amigas, formadas, chiques, sofisticadas, bonitas, bem cuidadas, independentes e quase todas separadas. Não houve conciliação entre a emancipação das mulheres e o machismo dos homens. Senti-me feliz pela decisão que tomei. Tentei viajar sozinha, estudar de novo, viver livremente, mas não consegui. Estava envolvida demais com o LU e o seu amor era a coisa mais importante para mim. A felicidade tem um preço muito alto. Aqui descobri o verdadeiro sentido da vida. Observo a ordenha das vacas e participo do cultivo das laranjeiras e dos mamoeiros, cujos frutos já começam a romper as flores brancas que foram fecundadas. Já sei ajudar por ocasião do nascimento dos bezerrinhos que saltitam endiabrados poucas horas após o nascimento. Gosto de abrir as torneiras para que a água se projete para fazer a aspersão todas as manhãs. Aprendi a ouvir o murmúrio do riacho que corre ligeiro pelo canavial. Quanta felicidade o mundo está perdendo. A natureza é a nossa riqueza maior e a mestra do nosso eterno aprender. Tanta coisa nos passam despercebidas e a nossa realidade se enche de vazios. Quanta beleza de cores e de poesia na despedida do sol … Quantas mensagens de Deus nós perdemos, nas grandes cidades, iluminadas pelo progresso, que nos chega através de uma nesga de luar. Aqui se vive a dimensão do universo. Aqui me tornei poeta ao entrar em contato com as coisas mais simples. A vida me ensinou que a felicidade é uma partilha do amor.     

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