Chuva de Gelo – IPU.
(Lívia Xerez).
Este é mais um
daqueles textos sem delimitação cronológica, mas com detalhes guardados no
coração.
Estávamos
voltando do Centro, Vovó Tereza e eu. Não lembro exatamente o que fomos fazer,
mas estávamos com os passos apressados para chegar em casa, afinal, o tempo
estava fechando e parecia que estava vindo uma chuva daquelas de deixar a Bica
marrom de tão barrenta.
Já estávamos
na calçada da Dona Nilce, vizinha muito querida por sinal, quando senti uma
coisa cair na minha cabeça. Logo pensei que fosse um tamarindo. Cocei o local
da pancada pra tirar algum resto de casquinha e imediatamente olhei para o chão
em busca do azedinho. O primeiro pensamento foi guardar a fruta na porta da geladeira.
Minha garganta sempre foi ruim e comer tamarindo quente seria irritação na
certa.
Mas não era
fruta nenhuma. Era gelo. Gelo caindo do céu do Ipu. Já tinha visto cair muita
neve na Suíça, um país da Europa muito frio boa parte do ano. Minha tia
Almerinda sempre mandava fotos lindíssimas daquele monte de neve branca, mas
cair gelo no Ipu eu não imaginava ver. Talvez por isso tenha sido tão legal e
tão bonito.
Lembro muito
da minha vó falando com alegria: “- Tá chovendo gelo, Meu Deus!”
Ficamos alguns
segundos ali, com as mãos para cima, tentando pegar algum inusitado gelo. Eram
pedrinhas pequenas, ovais e meio achatadas. Botei na boca (essa chance eu não
poderia deixar passar) e era gelo mesmo.
Passou uma senhora muito simpática e disse: “-
Terezinha, cuidado! Pode cair uma pedra grande de granito na sua cabeça e é
muito perigoso.” Na hora deu uma vontade de rir com as palavras trocadas, mas
claro que não disse nada. Naquelas épocas eu já tinha aprendido que o mais
importante é que a mensagem do emissor chegue ao receptor e, nesse contexto,
nem sempre precisamos das palavras corretas ou eruditas. Muito além do granito
ou do mármore, ficaram o carinho e a preocupação daquela senhora com a minha
avó e isso bastou.
Bom, granito
não iria cair, mas, de fato, poderia vir alguma pedrona de gelo. Na dúvida, entramos
em casa. Vovó foi cuidar da vida e eu botei a cadeira de plástico na ponta da
garagem e fiquei apoiada no portão vendo aquele gelo cair e derreter logo em
seguida.
Nos outros
dias até choveu, mas, para a minha tristeza, nem um cubinho de gelo apareceu
pra recontar a história.
Cheguei no
colégio e fui logo falando do granizo do Ipu. Os colegas não acreditaram muito
e então fui contar ao professor na esperança de receber apoio. Ele falou não
sei o que do clima, não sei o que lá do relevo e no final das contas deu a
entender que não seria muito possível. Eu vi o gelo, caiu na minha cabeça tão
certeiro que até coçou. Adorava aquele professor de geografia, mas fiquei meio
chateada com ele um bom tempo.
Não sei quando
aconteceu, mas aconteceu. Dia desses vi uma matéria de grande repercussão sobre
a chuva de granizo em Ipueiras. Deu uma vontade enorme de dizer: “Eu não
disse!”. Pois bem. Está dito.
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