O BURRO E AS RELÍQUIAS
Uma cidadezinha
do interior… e que ainda utilizava a tração animal para os serviços municipais,
inclusive a limpeza pública. Seu prefeito comprou um burro novo para aumentar a
frota, uma vez que os trabalhos haviam aumentado.
No primeiro dia de trabalho, colocaram o estreante em
uma carroça e o puseram-lhe a transportar algo que ele não entendia. No
entanto, esse primeiro dia de trabalho e
isso lhe deu muita alegria.
É que aconteceu algo que o deixou muito orgulhoso.
Por onde ele passava todos o reverenciavam, alguns
chegavam até a se ajoelharem quando ele se aproximava, e a altivez tomou conta
dele.
À noite, quando o recolheram ao estábulo, sua alegria
era tanta que quase não dormiu. Pela manhã, levantou-se contente para o novo
dia de trabalho.
Coitado! Que decepção. Ninguém lhe deu bola. Passava
por tudo e por todos e era ignorado.
– Tenho que fazer alguma coisa para reverter essa situação – pensou ele.
Ao se aproximar de alguém, ele relinchava, batia com
as ferraduras nos paralelepípedos para fazer barulho, porém nada acontecia.
Quando a noite foi levado à estribaria, estava muito revoltado.
E aí desabafou com um burro velho que estava a seu
lado.
– Esse povo daqui são todos doidos, malucos, idiotas.
Imagina você que ontem eu nem estava tão bonito
como hoje, pois me cuidei, me produzi dado o sucesso que fiz ontem, no entanto
me ignoraram, todos doidos, como já disse.
Seu colega, velho e inteligente e com muita
experiência, muita bagagem, o escutou e o olhou com piedade, pois sabia ele que
aquilo era apenas o começo.
Depois da narrativa perguntou-lhe.
– O que você transportava ontem?
– As relíquias de uma Igreja.
– E hoje?
– Tijolos, pedras, coisas comuns. Mas, isso não tem
nada haver.
– É aí que você se engana. Tem tudo a ver. Não era
para você que o povo fazia reverências, mas sim para as relíquias.
Muitas pessoas vivem transportando relíquias de
Igrejas e a multidão fazendo reverências a elas, e eles, pobres coitados,
imaginam que são os reverenciados.
Do livro: “Histórias nos Morrinhos”
De Amadeu Lucinda.
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