A M Ú S I C A N O R D E S T I N A
A música é o alimento da alma. E não é por acaso; a música nascendo na
alma, lhe retorna como forma de agradecimento e levando a alma á viajar
por universos que somente ela tem poder para isso.
A música não é
uma ciência igual as demais. A música é um grande alimento. É uma
ciência diferenciada, e um alimento não do físico, mas, sim do espírito.
Por tudo isso, ela tem o poder de nos transportar no tempo e no
espaço. Ela nos leva á lugares onde estivemos um dia e a ouvimos. Nos
leva á tempo e á certa ocasião e que, estão abernando em nosso
pensamento e a música nos faz acordar. Nos leva á assistir um filme e em
companhia de alguém que fora muito importante em nossa vida naquele
momento e que ela esteve presente. Também nos leva á dançar um baile que
nunca esquecemos. Ela também serve para mandarmos um recado, desabafar e
até ofender alguém. Também para pedirmos desculpas de erros cometidos
em momentos impensados e fazermos as pazes depois da borrasca. Por fim,
nos fazer entender.
A música é antes de tudo, comunicação. O ser
humano tem muitas formas de se comunicar: expressões corporais, gestos,
sinais e a mais conhecida forma que é fala. E que é a fala? É a
simplificação da música em sua forma primitiva. É como ainda se
comunicam os irracionais como são chamado nossos irmãozinhos ainda em
desenvolvimento. A música sempre existiu, é língua universal. Os
irracionais como não estudaram: geografia, matemática e essas outras
parafernálias que inventaram se comunicam da forma primitiva, a música.
Um cachorro polonês, inglês ou cearês, falam a mesma língua, o mesmo
idioma, se entendem.
Sendo a música comunicação, essa forma de
comunicar-se é que tem mudado ao decorrer dos tempos. Antes do rádio e
da televisão, a música chegava até nós dos quatro cantos do mundo
através da Igreja. Era através dela que a música chegava até nós. –
Desculpem-me, o mundo não tem canto. –
Porém, o que me propõe, é
falar da música nordestina. Foi essa a minha proposta. A música regional
nordestina é muito forte e esteve sempre presente naquela gente. O
baião, o côco, o chote, o xaxado; eram uma constância nos violeiros, nos
repentistas, nos emboladores, nos cegos, nos cangaceiros, nas Igrejas e
até mesmo nos funerais ela estava presente.
A música nordestina é
muito bonita e alegre. Mas, apesar da alegria de seu ritmo, os seus
versos são tristes. Seus versos são mais que uma oração, é uma súplica,
são um lamento.
Os compositores nordestinos vêm mandando seus
recados através de sua música há muito tempo. Os principais foram: Luiz
Gonzaga, Humberto Teixeira, Zé Dantas, Gordurinha, Patativa do Assaré,
entre outros. Vou citar algumas que são verdadeiras preces: Súplica
Cearense, Último Pau de Arara, Belém de Maria, Vendedor de Caranguejo, A
Triste Partida, ABC do Sertão, Pau de Arara, Estrada de Canindé, Vozes
da Seca, A Volta da Asa Branca e por fim como ninguém volta sem ter ido,
A Asa Branca, hoje conhecida como hino do sertão. Ela é de Luiz Gonzaga
e Humberto Teixeira; reproduz o sentimento do sertanejo durante uma
grande seca. Vou deixar sua letra, não para ser cantada, - Não que
esteja proibido, nada contra – mas sim, para ser analisado; o poeta
retrata o desespero do sertanejo quando sua terra é assolada pela seca
que nem mesmo essa ave que é símbolo do sertão resiste e foge. Também
vou colocar aqui as letras de: Vozes da Seca e Súplica Cearense. Não
porque sejam elas as mais autenticas da vida do sertanejo, pois temos
entre outras, “A Triste Partida” de Patativa do Assaré. Poucas famílias
do sertão nordestino não passaram por essa triste experiência de ver
um, ou mais de seus membros passarem por essa experiência. Porém essas
três mostram momentos daquela gente.
A Asa Branca mostra um momento crucial, quando nem mesmo aquela ave resistiu, teve que fugir.
Vozes da Seca retrata a humilhação quando um homem com toda saúde tem que receber benesses como esmola.
Súplica Cearense retrata duas coisas: o desespero e a ignorância que se somam na hora do desespero.
ABERNANDO ou IBERNANDO – Dormindo durante todo o inverno.
Asa Branca – Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.
Quando olhei a terra ardendo, qual fogueira de São João;
Eu perguntei á Deus do céu, porque tamanha judiação?
Que braseiro, que fornalha, nem um pé de plantação;
Por falta d’água perdi meu gado, morreu de sede meu alazão.
Inté mermo a Asa Branca, bateu asas do sertão;
Intonse eu dixe adeus Rosinha, guarda contigo meu coração.
Quando o verde nos teus óios, se espaiar na plantação;
Eu te asseguro, num chore não, viu, que eu vortarei viu,
Meu coração.
Vozes da Seca – de Luiz Gonzaga e Zé Dantas
Seu doutor o nordestino, tem muita gratidão:
Pelo auxílio dos sulistas, nessa seca do sertão.
Mas doutor uma esmola, á um homem que é são;
Ou lhe mata de vergonha, ou vicia o cidadão.
É por isso que pidimo, proteção á vósmicê;
Ome por nós escuído, para as rédeas do pudê.
Pois doutor dos vinte estados, temos oito sem chover;
Veja bem, quase a metade do Brasil ta sem comer.
Dê serviço ao nosso povo, encha os rios de barragens;
Dê comida há preço bão, não esqueça a açudagem.
Livre assim nós da esmola, que no fim dessa estiagem;
Lhe pagamos inté o juro, sem gastar nossa coragem.
Se o doutor fizer assim, salva o povo do sertão;
Quando um dia a chuva vim, que riqueza pra nação.
Nunca mais nós pensa em seca, vai dá tudo nesse chão;
Como vê, nosso distino, micê tem na vossa mão.
- Súplica Cearense – de Gordurinha e Nélinho.
Oh! Deus, perdoe esse pobre coitado,
Que de joelho resou um bucado;
Pedindo pra chuva cair sem parar.
Oh! Deus será que o senhor se zangou,
E só por isso o sol retirou;
Fazendo cair toda chuva que há.
Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho,
Pedi pra chover, mas chover de mansinho;
Pra ver se nascia uma planta no chão.
Meu Deus, se eu não pedi direito, o senhor me perdoe,
Eu acho que a culpa foi;
Desse pobre que nem sabe fazer oração.
Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água,
E ter lhe pedido cheinho de mágoa,
Pro sol inclemente se retirar.
Desculpe eu pedir a toda hora pra chegar o inverno,
Desculpe pra acabar com o inferno,
Que sempre queimou o meu Ceará.
Do Livro: “Fragmentos de Uma Oficina Acadêmica”
De Amadeu Lucinda.
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